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17/06/2022 às 11h13min - Atualizada em 16/06/2022 às 09h45min

Tragédia expõe terra sem lei na Amazônia, patrocinada pelo governo Bolsonaro

Análise técnica poderá confirmar identificação de Bruno e Dom, determinar causa das mortes e arma utilizada

RTV Cris Sekeff - rtvcrissekeff.com.br
Equipes de busca trazem restos mortais recolhidos em local indicado por preso, nesta quarta-feira (15) - Pedro Ladeira/Folhapress

Surgiu a notícia mais temida, nem por isso infelizmente menos provável, do paradeiro do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira, 41, e do jornalista britânico Dom Phillips, 57, desaparecidos na Amazônia desde a manhã do último dia 5.

De acordo com a Polícia Federal, um pescador envolvido com atividades ilegais confessou ter participado do assassinato e da ocultação dos cadáveres da dupla, que viajava de barco no extremo sudoeste do estado do Amazonas e visitava comunidades na vizinhança da Terra Indígena Vale do Javari, que abriga o maior número de povos isolados na floresta amazônica.

Restos humanos foram retirados do local apontado pelo suspeito.

Pereira trabalhou por uma década na Funai, onde atuou como coordenador da Vale do Javari e de Povos Isolados. Tinha ampla experiência na área, onde escolheu seguir trabalhando após exoneração do setor de isolados e licenciar-se do órgão federal, passando a colaborar com a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari).

Phillips acompanhava o indigenista para colher informações sobre o sistema de autodefesa dos povos locais contra invasões de garimpeiros, madeireiros, caçadores e pescadores ilegais. Elaborava um livro sobre como salvar a floresta pela qual se apaixonou ao se mudar para o Brasil em 2007.

Profissionais experientes, tinham conhecimento dos riscos de circular num canto do Brasil frequentado também pelo narcotráfico, tanto é que em boa parte dos trajetos contavam com escolta da Univaja. Um advogado da associação informou que seus integrantes e Pereira já haviam recebido ameaças dias antes.

Eram fortes, portanto, os sinais de que eles teriam sido alvos de uma emboscada. Apesar disso, o Planalto tardou a reagir, mobilizando esforços só depois de deflagrada intensa campanha nacional e internacional para encontrá-los.

O mais lamentável na lerdeza desumana do poder público é sabê-la em tudo condizente com o jaez de Jair Bolsonaro. Um presidente bilioso e errático, que subscreve as mais delirantes doutrinas de cobiça internacional pela Amazônia e hostiliza o quanto pode indigenistas, ambientalistas e jornalistas.

Se criminosos agem livremente naquele rincão amazônico é porque o Estado dali se ausentou. Bolsonaro mais uma vez fugiu à responsabilidade, chegando ao cúmulo da ignomínia ao inculpar os próprios desaparecidos e dizer que empreendiam uma "aventura" e que Phillips era "malvisto" na região.

Jornalismo não é aventura, a Amazônia não será da democracia brasileira enquanto pistoleiros, facínoras e desmatadores impuserem a lei do cão na região, e Bolsonaro não será presidente digno do cargo enquanto se mantiver alinhado aos destruidores da floresta. (Editorial Folha)

Investigação aguarda perícia e mira novos suspeitos

Os investigadores do assassinato do indigenista Bruno Pereira, 41, e do jornalista britânico Dom Phillips, 57, no Amazonas, dizem haver indícios da participação de uma terceira pessoa no crime e miram a possibilidade de novas prisões.

Além disso, aguardarão os resultados da perícia para confirmar se os restos humanos localizados nesta quarta-feira (15) são mesmo de Pereira e Phillips.

Nesta quarta, a Polícia Federal disse que um dos suspeitos investigados confirmou participação no assassinato do indigenista e do jornalista.

Segundo a PF, o pescador Amarildo da Costa Oliveira, o Pelado, indicou às autoridades onde havia enterrado os corpos, bem como ocultado a lancha em que viajavam Pereira e Phillips.

A perícia também vai determinar a causa da morte e a arma utilizada no crime. Segundo a PF, Pelado disse que as mortes ocorreram com disparo de arma de fogo.

O delegado da Polícia Civil Guilherme Torres disse que a força-tarefa no Amazonas não terminou nesta quarta-feira e que não se descarta a hipótese de outras pessoas estarem envolvidas.

Homem aponta para crânio humano e diz

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Charge do André Dahmer em homenagem aos assassinados do Vale do Javari - Folhapress

Além de Pelado, outro suspeito, Oseney de Oliveira, conhecido como Do Santos, foi preso na terça (14). Ele é irmão de Pelado, mas a PF disse que ele nega ter participado do crime.

Eduardo Alexandre Fontes, superintendente da PF no Amazonas, confirmou haver indícios de participação de uma terceira pessoa na morte do indigenista e do jornalista.

Pereira e Phillips desapareceram em 5 de junho quando retornavam de barco à sede do município de Atalaia do Norte (AM). Trata-se do município mais próximo à entrada da terra indígena Vale do Javari.

Segundo Fontes, foram feitas escavações num local de "dificílimo acesso" e sem sinal de telefone. O material encontrado seria enviado nesta quinta-feira (16) para o instituto de criminalística, em Brasília.

Na semana passada, após ser preso, Pelado afirmou em audiência de custódia em Atalaia do Norte que havia sido torturado e agredido por policiais do Amazonas.

Na ocasião, ele relatou que policiais o agrediram, usaram uma sacola em sua cabeça para sufocá-lo e que chegou a desmaiar na lancha que o transportou à cidade.

A Secretaria de Segurança Pública do Amazonas disse na ocasião que os relatos seriam "devidamente apurados" e que não compactuava com desvios de conduta. ​Nesta quarta, a PF levou Pelado ao local dos desaparecimentos. Ele estava totalmente coberto quando foi levado para a busca dos corpos.

Pelado e seu irmão vivem na comunidade São Gabriel, onde moram ribeirinhos que sobrevivem da pesca e da agricultura tradicional.

As buscas por vestígios de Pereira e Phillips estavam concentradas num trecho do rio entre São Gabriel e a comunidade Cachoeira.

Durante as buscas pelo indigenista e pelo jornalista, as equipes de buscas conseguiram localizar uma mochila, roupas e um documento pessoal do indigenista.

A investigação aponta a pesca e a caça ilegal na região —e os conflitos decorrentes das atividades ilegais— como pano de fundo do crime.

Segundo a polícia, Pelado indicou que a lancha em que viajavam Pereira e Phillips foi afundada propositadamente. A embarcação ainda não apareceu, mas será buscada nesta quinta-feira, disse Fontes. "Colocaram sacos de terra nela para ela afundar. Tiraram o motor, afundaram o motor."

​​Policiais também investigam um suposto financiamento da atividade ilegal de pesca e caça pelo narcotráfico na região, um problema comum em praticamente toda a tríplice fronteira do Brasil com Peru e Colômbia.

Se for confirmada a conexão com tráfico internacional de um eventual crime, o caso passará a ter natureza federal e será investigado somente pela PF.

Pereira e Phillips faziam uma viagem pela região próxima ao território indígena, o segunda maior do país, com 8,5 milhões de hectares, no extremo oeste do Amazonas.

A região do desaparecimento é marcada por forte exploração ilegal do pirarucu e de tracajás, principalmente dentro da terra indígena. Há relatos de tiros contra bases de fiscalização da Funai (Fundação Nacional do Índio) por parte de pescadores ilegais.



Fonte: Folha de São Paulo

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